segunda-feira, 18 de maio de 2009

O neo neonazismo


Neuland é uma "nova terra", onde não falta emprego aos cidadãos e o salário mínimo é de 840 euros (R$ 2,4 mil). Nesta República Federativa, o hino nacional é o último movimento da Nona Sinfonia de Beethoven e a capital foi batizada de Magno - para afirmar sua grandiosidade. Há três prédios interligados, com 200 mil metros quadrados e 160 andares cada um. Neuland poderia ser o país fictício de uma narrativa fantasiosa. Mas a mente de quem criou esta nação-babel, com 20 idiomas oficiais, é a mesma que está sendo acusada de planejar a morte de um rival, motivada por uma ideologia que já foi usada para justificar o assassinato de milhões de pessoas no século passado e se mostra viva no Brasil de 2009: o nazismo.

O paulista Ricardo Barollo, 34 anos, coordenador de projetos especiais da empreiteira Camargo Corrêa, foi apontado como mandante do crime que tirou a vida do estudante de arquitetura mineiro Bernardo Dayrell, 24, e sua namorada, a estudante Renata Waechter, 21, na madrugada de 21 de abril em Campina Grande do Sul, no Paraná, devido a uma disputa de poder. O crime descortinou uma rede organizada de nazistas no País, com ramificações em vários Estados e conexões com outros países.

Barollo e Dayrell eram líderes dos dois maiores movimentos nacionais. Defendiam que a raça branca estava em extinção e, por isso, a miscigenação deveria ter fim. A Neuland seria o país de extrema direita pautado na mesma ideologia que o ditador Adolf Hitler implantou na Alemanha a partir de 1934. Primeiro, o grupo tomaria São Paulo e os Estados do sul do País. Depois, conquistaria o território de 22 países da Europa.

Essa história veio à tona em 1º de maio, quando Barollo foi preso no bairro de Moema, em São Paulo, no apartamento de alto luxo em que morava com os pais - outros cinco acusados de participar do crime também foram detidos no Paraná. A partir daí, a polícia começou a ter acesso ao universo neonazista do qual faz parte o grupo. A rede com ramificações no Sudeste, Sul e Centro-Oeste do País é formada, em sua maioria, por jovens de classe média ou alta, com boa formação intelectual. A exigência é tão grande que, para ser admitido na facção, o candidato precisa passar por uma rigorosa prova.

A avaliação é realizada pelo computador, em um documento enviado por e-mail com uma senha de acesso e 30 perguntas dissertativas como "Os fins justificam os meios?", "Quem era Adolf Hitler?" e "Quais e como eram os principais governos da Europa na década de 40?". Quem responde de acordo com o que os fatos históricos comprovam é reprovado. Passa aquele cujas respostas são inspiradas no revisionismo, teoria que, entre outras coisas, nega o Holocausto. Os aprovados são "batizados" num lugar confirmado poucas horas antes do evento - apenas a cidade onde acontece a reunião é divulgada com antecedência. Segurando tochas de fogo, prometem honrar a imagem do Führer e o nacional socialismo.

Tamanha devoção é contida em ações discretas, como uma sociedade secreta. O movimento não tem sede, página na internet, nem nada que o identifique perante a sociedade. Os integrantes preferem se comunicar por e-mail ou mensagens instantâneas. Telefonemas, só em casos excepcionais. Encontros, quando inevitáveis, acontecem sempre em lugares diferentes, para não levantar suspeitas. Não há amadorismo. Os grupos são divididos em células.

A da propaganda serve para divulgar a ideologia por meio de revistas e cartazes. Na política, o foco é a formação de futuros partidos e a conquista de novos membros. Já a paramilitar é o setor armado, que dizem ser para defesa (não há indícios de que participem de algum tipo de treinamento). Mulheres não podem participar.

Mas é permitido que elas frequentem as festas, onde a bebida é controlada e as drogas são proibidas. Negros também podem ingressar no movimento, mas precisam ser "puros", sem mistura de raças. E jamais chegariam a líderes.

O detalhado plano da Neuland foi apresentado por Barollo aos seus seguidores em setembro de 2008. Primeiro, o grupo elegeria vereadores e o prefeito no Balneário Piçarras, em Santa Catarina. Em alguns anos, fortalecido, tomaria os Estados do Sul e São Paulo, num movimento separatista que criaria o novo país.

As fronteiras, porém, seriam fechadas a imigrantes. Barollo confirmou essas informações à polícia no dia da prisão, quando vestia uma camisa da seleção de futebol alemã. O que não contou é que o objetivo do grupo era bem mais ousado. Neuland, uma "terra prometida" fundamentada em "união, justiça e liberdade", ocuparia países que fazem parte da União Europeia, como Alemanha, Dinamarca, Espanha, Itália, Polônia, Suécia, entre outros.

Está tudo documentado como um plano de governo em pastas às quais ISTOÉ teve acesso. Barollo seria o presidente, com um salário de 10.560 euros (R$ 30 mil). Superior aos R$ 8.348,95 que ele recebia na Camargo Corrêa. Seu aniversário, 18 de julho, constaria como feriado nacional. Bandeiras, ministérios, empresas, cargos e leis também já estavam definidos.

Leia na integra - Istoé

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