segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Carta de Calvino perdoa o suicídio


Os protestantes calvinistas com freqüência demonstram certa indulgência em relação ao suicídio, como demonstra uma carta do célebre pastor João Calvino exposta a partir desta semana no Museu Internacional da Reforma em Genebra, em pleno coração da chamada "Roma protestante". "Fiz muitas reprimendas (...). Perguntei se não pedia o perdão de Deus pelo que havia feito e se não tinha confiança, sabendo que Ele teria ainda misericóridia", afirma a carta. Escrita em 1545, após a visita a um moribundo que havia apunhalado a si mesmo no abdome para acabar com seu sofrimento de tuberculoso, o texto, um relatório que Calvino escreveu para a polícia de Genebra, é "raro e inesperado", destaca a diretora do museu, Isabelle Graesslé.

"Eu o exortei com minhas palavras a armar-se de paciência e a consolar-se na graça de Deus", escreveu Calvino.

O documento de Calvino, roubado dos arquivos do Estado de Genebra em meados do século XIX, reapareceu publicamente em 2002 durante um leilão da Sotheby's. O manuscrito, conservado em perfeito estado, foi comprado por um colecionador e colocado novamente à venda após sua morte.

Em julho, a pedido do Museu da Reforma, um grupo de mecenas adquiriu a carta durante um leilão da Christie's em Londres por 70.000 libras e a doou ao museu.

Apesar da indulgência de Calvino, o caso do suicídio de Jean Vachat, do qual foi testemunha, não teve um final feliz.

Embora Calvino tenha se arrependido em duas ocasiões, o corpo não foi enterrado no túmulo familiar, como havia pedido o pastor, mas ao pé da forca na qual eram executados os condenados à morte.

"Durante muito tempo o suicídio foi considerado um crime triplo, contra o indivíduo, contra a sociedade e contra Deus", explica em um texto de análise Sandra Coram-Mekkey, colaboradora científica nos arquivos do Estado de Genebra. "Neste sentido, o suicídio envolve a justiça penal", acrescenta. Então era realizado um julgamento contra o morto ou sobrevivente e a sentença podia ser executada sobre o cadáver.

A clemência de Calvino, assim como outros exemplos similares, tendem a mostrar que o protestantismo era "muito liberal em sua prática de enterro de suicidas", afirma a Enciclopédia do Protestantismo, citada por Coram-Mekkey.

O manuscrito de Calvino, exposto com sua transcrição escrita, apresenta, segundo os diretores do estabelecimento, uma faceta "mais luminosa" do pastor. "O mostra em seu lado mais humano", completa Isabelle Graesslé.

(Terra)

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